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13 de fev. de 2017

A VERDADE NÃO IMPORTA...

“Não adianta, amiga, você acha que eles vão tomar alguma providência? Esses delegados são todos machistas, não vão dar a mínima pra você...”

Na delegacia:

-- É isso mesmo Sr. delegado, o menino tem uns dez anos e fica com o carro do pai andando na minha rua. Isso além de proibido é um crime, não acha?
-- Sem dúvida, minha Senhora, me dê o endereço, que vou mandar averiguar.
-- A rua onde moro?
-- Sim, não é lá que o garoto dirige?
-- É, como disse, mas o endereço não posso dizer.
-- A Sra, veio até a delegacia fazer uma denúncia, mas como podemos averiguar se não sabemos onde fica?
-- O pai dele dizem que é do tráfico, se disser, eu sei como é isso, vai acabar sabendo e vou ter problemas.
-- Não se preocupe, só eu vou ficar sabendo.
-- Ah é... muito bom então, é o Senhor mesmo que vai lá sozinho averiguar?
-- Claro que não, minha Senhora, sou delegado, vou mandar uma viatura.
-- E quem vai estar nessa viatura?
-- Provavemente dois policiais do turno.
-- O Senhor confia 100% neles?
-- Sim, claro, dentro do possível.
-- Tá vendo só, “dentro do possível”. Mas tenho uma ideia... estou vendo pela aliança que é casado, desculpe a curiosidade, mas o Senhor tem uma amante?
-- Amante? Pra que quer saber isso?
-- Por nada. Tem?
-- Não.
-- Não mesmo? Nunca bebeu com os amigos e saiu com uma garota assim-assim...?
-- Olha minha Senhora, não lhe conheço, não sei o que isso tem a ver com sua denúncia, tem gente aí na fila com casos gravíssimos, que tenho de atender...
--  Mas também não lhe conheço, e não vou contar a ninguém, diga...
-- Se disser me dá o endereço?
-- Sim, claro.
-- Ok, saí uma vez, agora escreva aqui o seu nome, RG e o endereço.
-- Pode me dar outro papel igual a esse?
-- Pronto, aqui está o papel. Agora escreva.
-- Obrigada, Sr. delegado, enquanto preencho neste, o Senhor só escreve seu nome e seu endereço neste outro.
-- Quer isso pra quê?
-- Por nada, meu jeito, meu pai era assim também, puxei dele. Se tenho que confiar no Senhor, que nem conheço, tem de confiar em mim também.
-- Pronto, aqui está o que me pediu, Senhora.
-- E aqui o meu, Sr. delegado.
-- É onde mora, certo?
-- É a minha rua, sim, mas o número é da casa do menino, acho que é mais importante, não?
-- Claro, deixa eu ver onde é isso... Ah sim, aqui perto. A que horas o tal menino costuma pegar o carro.
-- Varia, às vezes de manhã; às vezes depois do almoço. À noite nunca vi.
-- Está bem, amanhã mesmo mando uma viatura lá.
-- Muito obrigado, Sr. delegado.

No dia seguinte não vai nenhuma viatura, nem no outro dia. No terceiro dia o Delegado atende o telefone:
-- Pois não, quem..?
-- Sou aquela Senhora que esteve aí uns dias atrás fazendo a denúncia do menino que dirige na minha rua... Está lembrado?
-- Claro, como ia esquecer...
-- Que bom, não esqueceu de mim, mas esqueceu de mandar a viatura, né. Fiquei aqui de prontidão, não apareceu ninguém, bem que minha amiga disse.
-- Disse o quê?
-- Que isso era coisa pouca, que nem iam tomar conhecimento.
-- Diga a ela que está enganada, que só ainda não foi possível porque temos muito trabalho e pouca gente, mas vou mandar sim, fique tranquila.
-- Ele vai acabar atropelando alguém...
-- Imagino que sim, já está na lista das prioridades, Senhora.
-- Tenho seu endereço, viu..!
-- Que quer dizer com isso, está me ameaçando do quê?
-- Ah não, como ia ameaçar um delegado, não lembra da minha idade, acha que ando armada?
-- Desculpe, Senhora, acho que a interpretei mal.
-- Foi sim, só gravei nossa conversa, coisa que meu falecido pai também fazia... e só vou sossegar quando esse menino parar de circular com o carro do pai, tem que prender o irresponsável, um pai não pode fazer isso com uma criança.
-- Alô, alô... puta que o pariu!

-- Um dia depois:

“Falei que ia dar certo, amiga, a gente tem que ter fé. O doutor foi muito atencioso comigo, e você nem imagina quantas viaturas tinha aqui ontem. Foi uma fuzarca e acabaram prendendo o sujeito do 113, logo a imobiliária vai pôr a casa novamente pra alugar e vamos ser vizinhas. O que aconteceu com o menino? Que menino?...”

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