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12 de ago. de 2014

PATAGÔNIA

foto de Ângela Loij
















Uma foto de capa da National Geographic de um Yaghan coberto de rugas me fez ir às terras do fim do mundo, como é conhecido o arquipélago da Terra do Fogo.

Era outono e logo entendi de onde vinham as marcas daquele índio. Depois de Rawson e Trelew já ventava e fazia muito frio, que só não incomodava tanto porque a vontade de chegar era maior, mas esse chegar é só uma maneira de dizer, porque não tinha onde chegar, só tinha um ir até onde houvesse terras pra pisar.

E ficaram pra trás, Puerto Desejado, Cabo Blanco, Três Montes, e Paraíso, esta minúscula localidade com menos de vinte pessoas, referência e último posto de abastecimento antes do Estreito de Magalhães.

Ali terminava o continente americano. A travessia pelo lado chileno, em Puerto Aymont, fazia o barco jogar como uma caixa de fósforo com o encontro das águas mais altas do Pacífico com o Atlântico.

Rio Grande, Ushuaia, canal de Beagle e a ilha de Nasvarino também ficaram pra trás, e terra pra ir não tinha mais, adiante o Oceano Glacial Ártico e o Pólo Sul.

Todo retorno é sempre difícil. O frio, agora sim, era quase insuportável e como nos mapas da América parecia que tudo era subida, mas por alguma estranha atração dessas paisagens desoladoras não foi a única vez que estive nessas terras do fim do mundo.

Esqueci tudo de química, a maioria das fórmulas de matemática; apaguei professores, parentes, amigos de escola, policiais desastrados, talvez porque nada disso tenha sido importante, mas do maior e menos habitado deserto do planeta, dessa primeira estada, bem guardadas ficaram duas coisas: o cão foguino, que me acompanhou por dias, e o encontro com Ângela Loij.

Ambos viraram pó, mas não é pouco lembrar deles – o que o cão me disse não sei escrever, já Angela, com seus olhos rasgados e azuis, o peso dos seus sabe-se lá quantos anos, curvada e muito enrugada, era a última descendente dos Selk´nans, e num confuso  espanhol contou como os brancos mataram seu povo - lembrando dos pais, irmãos, filhos e netos, sabendo que não havia mais ninguém além dela e da memória de maldades inconcebíveis. Peron tinha acabado de voltar do exílio, e ser eleito novamente o presidente da Argentina. Pinochet tinha acabado de se tornar o presidente do Chile, mas eu não sei nada disso e não pus datas como ponho esparadrapos em qualquer arranhão, que minha  memória não dói.

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